Marinha Francesa e arqueólogos revelam cápsula do tempo submersa – Navio "Camarat 4" do século XVI
- Thais Riotto
- 28 de nov.
- 3 min de leitura

No início de 2025, uma operação de rotina da Marinha Francesa surpreendeu o mundo da arqueologia subaquática.
Durante uma missão de reconhecimento realizada com drones de alta tecnologia, um pelotão atingiu profundidades superiores a 2.500 metros, nas proximidades de Saint-Tropez, sul da França.
O que parecia ser apenas mais uma missão técnica transformou-se em uma das descobertas arqueológicas mais relevantes das últimas décadas: os restos de um navio mercante do século XVI, preservado em condições excepcionais.
Localização e Profundidade
O naufrágio, provisoriamente batizado de “Camarat 4”, repousa a cerca de 2.500 metros de profundidade, em águas francesas do Mediterrâneo.
Trata-se do naufrágio mais profundo já identificado em território marítimo francês e um dos mais profundos do próprio Mediterrâneo.
A localização estratégica, próxima à badalada Saint-Tropez, contrasta com o ambiente quase intocado onde o navio repousou por mais de 450 anos.
Estado de Preservação
A profundidade desempenhou um papel essencial na conservação da embarcação. As baixas temperaturas, a pressão extrema e a ausência de oxigênio no fundo marinho criaram uma cápsula do tempo que impediu saques e reduziu a ação de organismos degradadores.
Graças a essas condições, não apenas parte da estrutura do navio permanece íntegra, como também a carga preservou detalhes raramente encontrados em naufrágios dessa época.
Características do Navio e da Carga
O navio, com cerca de 30 metros de comprimento, corresponde a um típico mercante do Renascimento, robusto e adaptado para o comércio em rotas mediterrâneas. Entre os artefatos já identificados destacam-se:
Cerâmicas de diferentes formatos, incluindo jarros e pratos, possivelmente de origem italiana, sugerindo relações comerciais com a Ligúria.
Barras de ferro e outros itens metálicos, indicativos de circulação de matérias-primas entre portos.
Canhões ou peças de artilharia leve, evidenciando que mesmo embarcações comerciais necessitavam de meios de defesa contra pirataria e ataques inesperados.
Além da carga material, foram identificados símbolos religiosos e monogramas em algumas peças, entre eles inscrições ligadas à devoção católica da época, reforçando a forte dimensão espiritual presente na vida marítima do século XVI.
A Operação de Descoberta
A revelação do naufrágio foi possível graças à combinação de drones subaquáticos autônomos e ROVs (veículos operados remotamente).
Essa tecnologia permitiu não apenas a localização do casco, mas também a criação de um modelo tridimensional de alta precisão.
O processo incluiu filmagens, registros fotográficos em ultra definição e o uso de braços robóticos delicados para coletar amostras pontuais sem comprometer a integridade do sítio.
A operação foi conduzida pelo DRASSM (Departamento de Pesquisas Arqueológicas Submarinas da França), em colaboração com unidades especializadas da Marinha.
Importância Científica e Histórica
A descoberta oferece um olhar privilegiado sobre a dinâmica econômica e cultural do Mediterrâneo renascentista. As rotas comerciais entre norte da Itália e a costa francesa são confirmadas pela carga transportada, revelando o intenso fluxo de mercadorias e a diversidade de produtos em circulação.
O naufrágio também fornece informações técnicas sobre a construção naval do período, como métodos de reforço estrutural, uso de metais e disposição de armamentos em embarcações mercantes.
Por se tratar de um sítio preservado em profundidade recorde, representa ainda um marco metodológico, mostrando como novas tecnologias ampliam o alcance da arqueologia subaquática.
Planos de Conservação e Pesquisa
As autoridades francesas declararam que, por ora, não haverá uma escavação completa. A prioridade é a documentação digital e a preservação in situ. Modelos virtuais permitirão estudos detalhados sem a necessidade de remover peças do fundo marinho, reduzindo riscos de degradação.
A médio prazo, análises laboratoriais de madeira, metais e cerâmica auxiliarão na datação precisa e na identificação das rotas de origem da carga.
O sítio poderá se tornar referência mundial para o estudo da arqueologia submersa em águas profundas.
A descoberta do navio mercante do século XVI nas águas de Saint-Tropez vai muito além de um achado arqueológico. Trata-se de uma janela inédita para o comércio, a cultura e a espiritualidade da Renascença, preservada nas profundezas do Mediterrâneo.
Além disso, reafirma a relevância da cooperação entre forças militares e a comunidade científica, e mostra como a tecnologia atual pode revelar capítulos esquecidos da história.
O “Camarat 4” não é apenas um naufrágio: é um elo vivo entre o passado e o presente, resgatado pela ciência em um momento em que o oceano ainda guarda muitos de seus segredos.







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