O Fantasma sem Cabeça e o Nau Francês em Cabo Frio
- Thais Riotto
- 9 de out.
- 3 min de leitura

Local: Cabo Frio, RJ/BR
Cabo Frio: o palco entre história e lenda
A costa de Cabo Frio, no litoral do Rio de Janeiro, é famosa pelas águas cristalinas e pelas praias paradisíacas. Mas, por trás do cenário turístico, esconde-se um passado turbulento.
Desde o século XVI, quando os portugueses chegaram, a região foi disputada por franceses atraídos pelo comércio do pau-brasil.
Entre enseadas traiçoeiras, bancos de areia e mar agitado, surgiram naufrágios, batalhas e mortes misteriosas. Foi nesse ambiente que nasceu a lenda do Fantasma sem Cabeça, associada a um navio francês destruído na região.
O contexto histórico: franceses em território proibido
Entre os séculos XVI e XVII, a presença francesa no litoral fluminense era uma ameaça constante.
Em 1615, tropas portuguesas, com apoio de indígenas aliados, expulsaram colonos franceses que insistiam em explorar a costa. Relatos de confrontos navais entre galeões portugueses e naus francesas circulavam nas crônicas da época.
É nesse caldo de pirataria, batalhas e naufrágios que se situa a narrativa do navio francês perdido em Cabo Frio um episódio que, embora não esteja em documentos oficiais, sobreviveu na tradição oral da cidade.
Naufrágios reais: os ossos da história
A região de Cabo Frio tem registros documentados de acidentes marítimos:
Veleiro Wizard (1839): encalhado próximo à Ponta do Anequin, nas proximidades da Ilha do Farol, segundo cartas náuticas do século XIX.
Outros vapores e cargueiros (séculos XIX e XX): casos como o vapor Harlingen e embarcações pesqueiras menores aparecem em jornais e registros de naufrágios, reforçando a fama da região como um “cemitério marítimo”.
Esses naufrágios reais dão peso à ideia de que um navio francês seja de guerra ou de comércio também pode ter sucumbido nas mesmas águas traiçoeiras.
Fantasma sem cabeça
Segundo moradores e pescadores, em noites de neblina ou de mar revolto, surge na orla de Cabo Frio a figura de um homem sem cabeça, caminhando lentamente pela areia, sempre próximo à Ilha do Farol ou às dunas da região da figueira.
Para alguns, seria o capitão francês de uma nau derrotada, decapitado em batalha contra portugueses.
Para outros, seria um cavaleiro europeu, vítima de traição, condenado a vagar até encontrar sua cabeça.
Há ainda quem diga que se trata de um marinheiro punido por motim, cuja alma jamais encontrou repouso.
Locais marcados pelo sobrenatural
A lenda se concentra em pontos específicos:
Ilha do Farol: palco de naufrágios documentados e de relatos de luzes misteriosas no mar.
Ponta do Anequin: onde o Wizard encalhou em 1839, local de forte correnteza e mar traiçoeiro.
Boqueirão e enseadas próximas: áreas citadas em relatos de pescadores como locais de aparições.
Esses lugares, conhecidos por acidentes reais, reforçam o elo entre o concreto e o imaginário.
Testemunhos e sinais sobrenaturais
Moradores e navegadores noturnos relatam fenômenos curiosos ligados ao fantasma:
Luzes azuladas que parecem lanterna de navio antigo piscando sobre as ondas.
Vozes e gritos carregados pelo vento, lembrando ordens militares em língua estrangeira.
Aparição da figura sem cabeça: descrita como uma sombra ereta, com roupas antigas, que some repentinamente ao ser observada de perto.
Tais relatos, transmitidos de geração em geração, transformaram o fantasma em um símbolo da memória oral de Cabo Frio.
História, mito e turismo
Enquanto a arqueologia marítima busca identificar naufrágios reais como o Wizard e outros navios do século XIX , a população mantém viva a tradição do fantasma.
Hoje, a história é incorporada em roteiros turísticos, contada em passeios culturais e em registros fotográficos que circulam em redes sociais.
Entre a névoa e o arquivo
O Fantasma sem Cabeça é o resultado de duas forças complementares:
O registro histórico: naufrágios documentados, presença francesa em Cabo Frio, batalhas coloniais e acidentes no século XIX.
O imaginário coletivo: figuras decapitadas, luzes sobrenaturais e murmúrios do mar, que dão voz ao trauma e à memória de séculos de mortes no litoral.
Assim, Cabo Frio não é apenas um destino de águas claras, mas também um território onde a história se confunde com o sobrenatural, e onde o passado insiste em ressurgir, seja em ossos de navios soterrados ou em sombras sem cabeça caminhando pela areia.







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